PARECER
A CONSULTA
IBCCrim – Instituto Brasileiro de Ciências
Criminais me honra formulando-me a seguinte consulta:
Em face da Constituição Federal de 1988, o Ministério Público pode realizar
e/ou presidir investigação criminal, diretamente?
A questão posta pela consulta não é complicada nem demanda grandes
pesquisas doutrinárias, porque a Constituição Federal dá resposta precisa e
definitiva no sentido de que o Ministério Público não tem competência para
realizar investigação criminal direta.
I.Preliminares
1. Antes de discutir o mérito do consulta cumpre fazer alguns
esclarecimentos preliminares. A primeira delas é que, aqui, não se levará
em conta as questões de conveniência ou de oportunidade de se conferir ao
Ministério Público poderes investigatórios na esfera penal. Isso pode ser
uma discussão de lege ferenda, não de lege lata, porque a Constituição já
dá a solução. Por isso, também não é pertinente discutir aqui o bom ou o
mau funcionamento do sistema adotado. Sem as generalizações indevidas,
injustas e injustificadas, pode-se reconhecer procedência às críticas
relativas à ineficiência e a morosidade das investigações, assim como não é
destituído de verdade o argumento do Ministério Público de que “Não é raro
ver-se policiais que são responsáveis pela prevenção e repressão da
criminalidade envolvendo-se com o crime organizado e na prática de atos de
corrupção com o objetivo de impedir a investigação de delitos, bem como
cometendo atos de violência (p. ex.: tortura) ou abuso de poder”. Esse
envolvimento não é apenas da policia. Uma das características do crime
organizado está no envolvimento de autoridades públicas como um dos modos
de sua ação e de sua impunidade. Não falta quem diga que o fato de a
polícia estar na linha de frente da investigação criminal contribui para a
contaminação de alguns de seus elementos, e não é garantido que, se o
Ministério Público assumisse tal condição, ficaria imune aos mesmos riscos.
Sobre esses aspectos, vale a pena transcrever a seguinte passagem de
parecer que o ilustre constitucionalista Luís Roberto Barroso ofereceu ao
Secretário Especial dos Direitos Humanos, Ministro Nilmário Miranda:
“Sem a pretensão de uma elaboração sociológica mais sofisticada, e muito
menos de empreender qualquer juízo moral, impõe-se aqui uma reflexão
relevante. No sistema brasileiro, é a Polícia que atua na linha de
fronteira entre a sociedade organizada e a criminalidade, precisamente em
razão de sua função de investigar e instaurar inquéritos criminais. Por
estar à frente das operações dessa natureza, são os seus agentes os mais
sujeitos a protagonizarem situações de violência e a sofrerem o contágio do
crime, pela cooptação ou pela corrupção. O registro é feito aqui, porque
necessário, sem incidir, todavia, no equívoco grave da generalização ou da
atribuição abstrata de culpas coletivas.
“Pois bem: não se deve ter a ilusão de que o desempenho, pelo Ministério
Público, do papel que hoje cabe à Polícia, manteria o Parquet imune aos
mesmos riscos de arbitrariedade, abusos, violência e contágio”.2. A esse
propósito, não é demais recordar o exemplo italiano. O Ministério Público
brasileiro ficou muito entusiasmado com a atuação dos Procuradores
italianos na chamada operação “mãos limpas”, que teve inequívoco sucesso no
combate aos crimes mafiosos. Como se sabe, na Itália vigorava até 1989 o
juizado de instrução, quando foi suprimido, e os poderes de inquérito e de
investigação concentraram-se nas mãos do Ministério Público. Essa
transformação proveio da legislação anti-máfia e teve impacto imediato, mas
não tardou a surgirem os abusos de poder. O Procurador Di Pietro, o mais
destacado membro do Ministério Público de então, teve que renunciar ao
cargo em conseqüências das denúncias de desvio de poder; assim também se
deu com Procuradores na Sicília. Então, a suposição do parecer do Prof.
Luís Roberto Barroso é algo que a experiência já provou.
O Ministério Público no Brasil é hoje uma Instituição da mais alta
consideração pública por sua atuação ética e sua eficiência que é preciso
conservar e defender. E um dos modos eficazes dessa defesa consiste em
mantê-lo dentro dos estritos contornos de suas funções institucionais que
não inclui a função investigatória direta.
3. Enfim, seja como for, o certo é que o eventual mau funcionamento do
sistema de investigação criminal pela polícia judiciária, como qualquer
outro defeito ou deficiência que se possa verificar, não tem a força de
transferir para outra instituição sua competência constitucionalmente
estabelecida, nem autoriza que outra instituição o assuma, mesmo
subsidiariamente.
II. A competência para a investigação criminal
4. O signatário deste parecer, enquanto assessor na Constituinte, apoiou e,
nos limites de suas possibilidades, ajudou na formulação das normas que
deram ao Ministério Público a posição de destaque como instituição
constitucional permanente e autônoma. Conheci do assunto desde o primeiro
Anteprojeto da Subcomissão da Organização do Poder Judiciário e Ministério
Público, cujo relator foi o Deputado Constituinte Plínio de Arruda Sampaio,
oriundo da instituição, que se inspirou na organização da instituição no
Anteprojeto da Comissão de Estudos Constitucionais (Afonso Arinos), de que
foi relator o então Procurador-Geral da República e hoje Ministro Sepúlveda
Pertence, que mereceu o meu apoio no plenário daquela Comissão. Na
elaboração desse Anteprojeto, na Constituinte, não estiveram ausentes as
Associações de Ministério Público, especialmente a Associação do Ministério
Público de São Paulo, que se manteve sempre presente na defesa da
instituição durante a elaboração constitucional. Pois bem, o texto desse
Anteprojeto (arts. 43 a 46), aprovado pela Subcomissão em 25 de maio de
1987, já continha, em essência, tudo que veio a ser contemplado na
Constituição, no qual não há uma palavra que atribua ao Ministério Público
a função investigatória direta. Lá estava, como função privativa, “promover
a ação penal pública” e “promover inquérito para instruir ação civil
pública”, como estava também, sem exclusividade (art. I, “a” e “b”), “o
poder de requisitar atos investigatórios criminais, podendo efetuar
correição na Polícia Judiciária, sem prejuízo da permanente correção
judicial” (art. 45, II, “e”); essa correição foi convertida, depois, em
controle externo da atividade policial. Ora, se o Ministério Público estava
interessado na investigação criminal direta seria de esperar que constasse
desse Anteprojeto algo nesse sentido, já que o relator era um Constituinte
afinado com a instituição. As únicas disposições aproximadas a isso vieram
no Anteprojeto da Comissão da Organização dos Poderes e Sistema de Governo
(junho de 1987), de que foi relator o Constituinte Egídio Ferreira Lima. O
art. 137, inc. V, incluía entre as funções institucionais do Ministério
Público, além da competência para ‘requisitar atos investigatórios’, também
exercer a supervisão da investigação criminal”, assim como a faculdade de
‘promover ou requisitar a autoridade competente a instauração de inquéritos
necessários às ações públicas que lhe incumbem, podendo avocá-los para
suprir omissões..”. Isso se manteve no Projeto de Constituição (Comissão de
Sistematização, julho de 1987, art. 233, § 3º). Já no Primeiro Substitutivo
do Relator Bernardo Cabral (Comissão de Sistematização, agosto de 1987),
essas normas sofreram alguma transformação importante, excluindo-se a
possibilidade de “promover … a instauração de inquérito necessários às
ações públicas”, bem como se eliminou a possibilidade de “avocá-los para
suprir omissões”. Ou seja, suprimiu aquilo que o Ministério Público hoje
ainda pretende: o poder de investigação subsidiário. O texto ficou com o
seguinte teor:
“Art. 180. São funções institucionais do Ministério Público, na área de
atuação de cada um dos seus órgãos:
“VI – requisitar a instauração de inquérito policial, determinar
diligências investigatórias, podendo supervisionar a investigação criminal
e promover inquérito civil”.
Note-se que, no Segundo Substitutivo do Relator Bernardo Cabral (Comissão
de Sistematização, setembro de 1987), nova transformação sofreu essa
competência. Nele, já não consta a faculdade de “supervisionar a
investigação criminal”, e “promover inquérito civil” foi para outro
dispositivo, conectado com “ação civil pública” (art. 151, III: “promover
inquérito civil e a ação civil,.. “), o que tem relevo para a interpretação
da norma. Demais, a função de “requisitar a instauração de inquérito
policial” e “determinar diligências investigatórias” já não é direta, mas
indireta e não imperativa, como se vê da leitura do § 40 do art. 151:
“Serão sempre fundamentadas as promoções e as cotas dos membros do
Ministério Público, inclusive para requisitar diligências investigatórias e
instauração de inquérito policial”. E assim foi aprovado na Comissão de
Sistematização, integrando o Projeto de Constituição “A” (novembro de
1987), a ser submetido ao Plenário, em primeiro turno. Surgiu, então, o
Projeto Substitutivo do Centrão, que sugeriu diversas reduções nas funções
institucionais do Ministério Público, mas não foram aceitas. O texto
aprovado decorreu de um acordo das lideranças, conseqüente da fusão de
diversas emendas, a de n. ZPOOI2-0 do Constituinte Alexandre Costa, dando
nova redação àquele §4º do art. 151 (supra), restabeleceu a competência
direta para requisitar diligência investigatória e a instauração de
inquérito policial, mas nenhuma proposta no sentido de dar ao Ministério
Público função investigatória direta. O Constituinte Plínio de Arruda
Sampaio, defensor intransigente das prerrogativas da instituição,
sustentou, na tribuna, o acordo, mostrando que “a instituição do Ministério
Público foi delineada na Subcomissão do Poder Judiciário [de que ele foi
relator, diga-se, de passagem] com o objetivo claro de criá-la forte,
autônoma, independente do Executivo. O que se quer é um fiscal da lei com
plenos poderes para exercer a ação penal, inclusive contra aquele que o
nomeia, contra o Presidente da República (…) Além dessa autonomia, um
segundo aspecto básico da construção do Ministério Público foi aprovado na
Subcomissão.
Consiste em conferir à instituição atribuições maiores do que simplesmente
a de perseguir os criminosos: estamos dando-lhe também atribuição de
defender a sociedade como um todo. Defender quem não tem quem o defenda”.
Quem é hoje que não tem quem o defenda: O índio. a natureza, o consumidor.
“Por isso, todo um elenco de competências foi atribuído ao novo órgão
Ministério Público, no âmbito da perseguição do ilícito civil”. Não há uma
palavra em favor da possibilidade do Ministério Público proceder a
investigação direta.
As regras constantes do acordo vieram a integrar o Projeto de Constituição
“B” (junho de 1988), submetido ao Plenário, em segundo turno, sendo assim
aprovado, constituindo o Projeto de Constituição “C” (setembro de 1988),
destinado à redação final, mantido tal qual no Projeto de Constituição “D”
(20.9.1988), com a transposição do conteúdo do §4º do então art. 158 para o
inc. VIII do mesmo artigo. Assim, com outros ajustes de redação, os arts.
156 a 159 do Projeto aprovado em primeiro turno vieram a constituir os
arts. 127 a 130 da Constituição.
5. Essas observações históricas sobre a formação constitucional da
instituição não pretendem perquirir a intenção do legislador constituinte
para dela extrair o sentido das normas. Não, esse originalismo não se
compadece com os processos modernos de interpretação constitucional. O que
vale não é a intenção do legislador, mas a intencionalidade das normas
constitucionais, o que significa que o sentido de cada norma ou de cada
conjunto de normas se extrai do plexo de valores que foram incorporados na
Constituição. Essa incorporação se deu por ação dos Constituintes, não pela
intenção de cada um, mas pela conjugação da vontade constituinte, não da
vontade psicologicamente identificada, mas pela vontade culturalmente
constituída, porque vontades que agiam em função de valores, por isso mesmo
acolhendo uns e recusando outros. Por isso é que a Constituição é um
sistema de valores. Por isso também é que processos de formação
constitucional tem interesse, não para a interpretação das normas
acolhidas, mas para conhecer os valores que não foram acolhidos, que foram
rejeitados, e que, por essa razão mesma, não podem ser invocados para a
composição de direitos, menos ainda de competências, tanto mais quando a
competência pretendida tenha sido outorgada a outro órgão ou instituição como
é o caso, já que a Constituição conferiu à polícia civil estadual e federal
a função de polícia judiciária e a de apuração das infrações penais (art.
144, parágrafo 1º e 4º).
6. Percorram-se os incisos em que o art. 129 define as funções
institucionais do Ministério Público e lá não se encontra nada que autorize
os membros da instituição a proceder a investigação criminal diretamente. O
que havia sobre isso foi rejeitado, como ficou demonstrado na construção da
instituição durante o processo constituinte e não há como restabelecer por
via de interpretação o que foi rejeitado. Se a Constituição tivesse
silenciado sobre o tema, ainda se poderia discutir sobre a possibilidade de
se ser a matéria conferida ao Ministério Público, por via de lei, como se
fez na Itália, onde se retirou o poder investigatório do juiz de instrução,
passando, por lei, para os Procuradores da República que funcionam junto
dos Tribunais. Mesmo assim o Ministério Público na Itália não tem esse
poder autonomamente, porque a polícia judiciária não depende dele
integralmente, mas da autoridade judiciária (Constituição italiana, art.
109), pois a Constituição italiana só tem um dispositivo sobre o Ministério
Público para impor-lhe o dever de exercer a ação penal (art. 112). A
Constituição portuguesa tem dois artigos sobre o Ministério Público, mas
não dispõe sobre sua competência, deixando para a lei (arts. 221 e 222),
por isso a lei pôde integrar a polícia judiciária na organização do
Ministério Público com competência exclusiva para a instrução preparatória
das infrações penais2. Na Espanha, não é ao Ministério Público que cabe a
função investigatória, só por si diretamente. Lá a função de averiguação
dos delitos cabe à polícia judiciária que, no entanto, no exercício dessa
função, depende do juiz, dos Tribunais e também do Ministério Público
(Constituição,art.126). Na Colômbia, sim, a Constituição dá competência
direta à Procuradoria Geral da Nação (Fiscalía General de la Nación) para
investigar os delitos e acusar os presumidos infratores ante os juízos e
tribunais competentes (art. 250).
7. Essas indicações do direito estrangeiro só
têm a utilidade de mostrar que o regime da matéria no Brasil é próprio,
peculiar e único, porque define os campos de atuação do Ministério Público
e da Polícia Judiciária com precisão, e sem dependência recíproca, de sorte
que a invocação de doutrina estrangeira sobre o assunto não traz a menor
contribuição ao seu esclarecimento. Nem é necessário recorrer a grandes
indagações doutrinárias, diante do que está estabelecido nas normas
constitucionais.
III. A doutrina dos poderes implícitos
8. No material que me foi apresentado para a elaboração deste parecer
consta que o Ministério Público argumenta que, ainda que se entenda que a
Constituição não lhe tenha conferido expressamente os poderes
investigatórios, na esfera penal, é de ser aplicada a doutrina dos poderes
implícitos, pois se a Constituição lhe assegura a competência privativa
para promover a ação penal pública, deve ter-lhe também assegurado os meios
para alcançar esse fim.
9. Essa concepção da doutrina dos poderes implícitos, com a devida vênia,
não é correta. Primeiro, é preciso indagar se entre a investigação penal e
a ação penal ocorre uma relação entre meio e fim. O meio para o exercício
da ação penal consiste no aparato institucional com a habilitação,
competência adequada e condições materiais, para fazê-lo.
O fim (finalidade, objetivo) da investigação penal não é a ação penal, mas
a apuração da autoria do delito, de suas causas, de suas circunstâncias. O
resultado dessa apuração constituirá a instrução documental – o inquérito –
(daí, tecnicamente, instrução penal preliminar) para fundamentar a ação
penal e servir de base para a instrução penal definitiva. Segundo, poderes
implícitos só existem no silêncio da Constituição, ou seja, quando ela não
tenha conferido os meios expressamente em favor do titular ou em favor de
outra autoridade, órgão ou instituição. Se ela outorgou expressamente a
quem quer que seja o que se tem como meio para atingir o fim previsto, não
há falar em poderes explícitos.3 Como falar em poder implícito onde ele foi
explicitado, expressamente estabelecido, ainda que em favor de outra
instituição?
10. O exemplo do constitucionalismo brasileiro se verificou no regime da
Constituição de 1891, relativamente à figura do interventor, porque ela
disciplinava a intervenção federal nos Estados (art. 60), mas não previa
essa entidade. Reconheceu-se, em face disso, que era legítima a nomeação de
um interventor no caso de intervenção com o afastamento do Governador. O
Presidente da República reivindicou essa competência. Ruy Barbosa, no
entanto, argumentou em contrário, pois nem a Constituição lhe dava esse
direito nem lho dava nenhuma lei do País, porque esse poder cabia ao
Congresso Nacional. “Desta arte [disse Ruy], reconhecendo que a
Constituição se não ocupava com a entidade do interventor, reconhecia eu ao
legislador nacional o direito de, no uso da faculdade a ele conferida pelo
art. 60, n. 2, criar por lei a intervenção e confiá-la a um interventor”4
Nesse texto temos duas lições importantes para a conclusão deste assunto.
Primeiro, o poder implícito só ocorre quando Constituição não se ocupa da
matéria; segundo, não cabe a determinado órgão a competência que está
prevista para outro. No caso sob nossas vistas, a Constituição se ocupou do
tema, conferindo a investigação na esfera penal à polícia judiciária, logo,
ela não cabe a nenhum outro órgão ou instituição, nem, portanto, ao
Ministério Público.
IV. O mais e o menos em direito. Investigação seletiva?
11. Outro argumento que consta em favor da competência investigatória
direta do Ministério Público é a de que, sendo ele titular da ação penal
pública, também há de ter o poder de investigação criminal, sob o argumento
de que “quem pode o mais pode o menos. Se esse prolóquio tem algum valor no
campo de direito privado, não sei, mas no campo do direito público,
especialmente no direito constitucional, não tem nenhum valor. Não é uma
parêmia a que se dá valor de regra interpretativa. O que é mais e o que é
menos no campo da distribuição das competências constitucionais? Como se
efetua essa medição, como fazer urna tal ponderação? Como quantificá-las?
Não há sistema que o confirme. As competências são outorgadas expressamente
aos diversos poderes, instituições e órgãos constitucionais. Nenhuma é
mais, nenhuma é menos. São o que são, porque as regras de competência são
regras de procedimento ou regras técnicas, havendo eventualmente regras
subentendidas (não poderes implícitos) às regras enumeradas, porque
submetidas a essas e, por conseguinte, pertinente ao mesmo titular. Não é o
caso em exame, porque as regras enumeradas, explicitadas, sobre
investigação na esfera penal, conferem esta à polícia judiciária, e são
regras de eficácia plena, como costumam ser as regras técnicas.
12. Assim mesmo se pode discutir sobre o que é mais e o que é menos entre a
investigação e a ação judicial penal. A investigação é um procedimento de
instrução criminal (preliminar, preparatória) em busca da verdade e da
formação dos meios de prová-la em juízo. A ação é um ato pelo qual se
invoca a jurisdição penal. Procedimento da instrução penal preliminar, como
qualquer procedimento, é uma sucessão de atos concatenados que se registram
e se documentam no inquérito policial, que vai servir de base para a
propositura da ação penal ou não, conforme esteja ou não configurada a
prática do crime, sua autoria e demais elementos necessários à instrução
penal definitiva. O resultado positivo da investigação do crime é que
constituirá pressuposto da ação penal viável. Sem a investigação prévia da
verdade e dos meios de prová-la em juízo é impossível a ação penal, diz bem
Canuto Mendes de Almeida.5 Pode-se estabelecer urna relação de mais e de
menos entre esses elementos?
13. Demais, se o argumento do “quem pode o mais pode o menos”, assim como o
argumento, muito parecido, dos poderes implícitos, fossem procedentes, a
coerência exigiria que o Ministério Público assumisse inteiramente as
função investigativa. Mas não é isso que ele pretende, como mostra esta
passagem de memorial apresentado a Ministros do Supremo Tribunal Federal:
“Frise-se que o Ministério Público não pretende substituir-se,
indistintamente, a Polícia Judiciária na investigação das infrações penais,
mas dispor de meios para obter diretamente, de modo mais célere e eficaz,
em determinadas situações e quando o interesse público o exige, as provas e
informações que necessita para a formação de seu convencimento sobre a
viabilidade da ação penal (p.24). Esse texto é exemplar. Ele reconhece que
a competência é da Polícia Judiciária. Implicitamente denuncia que o
Ministério Público não tem o poder de investigação na esfera penal, senão
não reivindicaria exercê-la apenas em determinadas situações. De fato, ai
só se pleiteia substituir-se a Polícia Judiciária “em determinadas
situações e quando o interesse público o exige. Quem decide quais são essas
‘determinadas situações, quem decide quando o interesse público o exige’? O
próprio Ministério Público a seu alvedrio? Isso só cria incertezas e
confusão. Ora, toda investigação criminal é de interesse público. Este a
exige em todos os casos em que um delito se manifesta. Qual o critério de
seleção, o de maior repercussão na mídia? E certo que um dispositivo do Ato
98/96 do Ilustre Procurador-Geral da Justiça de São Paulo, o mesmo que
subscreve o memorial apresentado aos Eminentes Ministros do Supremo
Tribunal Federal, pretendeu estabelecer casos em que isso pudesse ocorrer.
Sobre esse dispositivo, falarei mais adiante (item 20).
V. Uma competência exclusiva
14. De passagem, já me manifestei sobre o tema,
nos termos seguintes: “o art. 144, § 4º, estatui que às polícias civis,
dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a
competência da União, as funções de polícia judiciária, e a apuração de
infrações penais, exceto as militares. Isso quer dizer que a Constituição
reservou à polícia civil estadual um campo de atividade exclusiva que não
pode ser invadido por norma infraconstitucional e, menos ainda, por
disposições de ato administrativo. Uma delas é a realização do inquérito
policial, que constitui o cerne da atividade de policia judiciária, que não
comporta o controle do Ministério Público. A outra é que também à polícia
civil, policia judiciária, se reservou a função de apuração das infrações
penais, o que vale dizer o poder investigatório, sendo, pois, de nítido
desrespeito à Constituição normas que atribuam a órgão do Ministério
Público a faculdade de promover diretamente investigações como o fez o art.
26 do ato 98/96”6.
15. Argumenta-se que a Constituição não deferiu à Polícia Judiciária o
monopólio da investigação criminal. É verdade, mas as exceções estão
expressas na própria Constituição e nenhuma delas contempla o Ministério
Público. O próprio parágrafo 4º do artigo 144 ressalva a competência da
União em contemplação da Polícia Judiciária Federal (art. 144, §1º) e
exclui da competência da Policia Judiciária a apuração das infrações penais
militares, em harmonia com o art. 124, com base no qual cabe a polícia judiciária
militar, exercida por autoridades das corporações militares, a função de
apuração dos crimes militares no âmbito de cada qual, por meio de inquérito
policial militar.7
16. Outra exceção que se costuma lembrar é a do poder investigatório das
comissões parlamentares de inquérito, que também é expresso na Constituição
(art. 58, §3º), mas o inquérito parlamentar não é um típico inquérito
criminal, porque visa apurar fato determinado de qualquer natureza:
político, administrativo, responsabilidade civil e também criminal, como se
nota do final do §3º do art. 58, tanto que suas conclusões, nem sempre
dispensam investigações policiais, como a experiência tem mostrado, porque,
no fundo do inquérito parlamentar, se movem interesses e métodos políticos,
nem sempre compatíveis com uma instrução penal preliminar, que, como nota
Canuto Mendes de Almeida, invocando a lição dos grandes processualistas e
da legislação, tem por finalidade preservar a inocência contra as acusações
infundadas e o organismo judiciário contra o custo e a inutilidade em que
estas redundariam8. É certo que as comissões parlamentares de inquérito
realizam também atividade de investigação, e essa é a sua única função que
ressalta do seu próprio nome, investigação não tipicamente criminal, mas também
criminal, e, nesse aspecto particular, pode-se ter essa investigação como
exceção ao disposto no art. 144, parágrafos 1º e 4º, mas exceção expressa.
17. Num texto da lavra do ilustre processualista Antônio Scarance
Fernandes, transcrito na já referida peça do Ministério Público de São
Paulo, menciona-se também que é muito comum a apuração indireta de crimes
através de sindicâncias e processos administrativos”. Essa idéia está
conectada com a outra segundo a qual o inquérito policial é facultativo,
citando-se a propósito o art. 4º, parágrafo único, do Código de Processo
Penal que diz que a atribuição, no caput, da função de polícia judiciária
não exclui a de autoridade administrativa, a quem por lei seja cometida a
mesma função. A questão hoje consiste em saber se uma tal lei se sustenta
em face do art. 144, §§ 1º e 4º, da Constituição. Será nitidamente
inconstitucional, como qualquer lei ordinária ou complementar que atribua a
função de polícia judiciária, vale dizer, de investigação na esfera penal,
a qualquer outra autoridade, órgão ou instituição. Ora, para membros do
Ministério Público, normalmente profundos conhecedores do direito,
inclusive do direito constitucional, não é sequer necessário insistir
nisso.
18. A tese de que o inquérito policial é facultativo não é bem correta. O
que é certo é que ele é dispensável, quando a notitia criminis consta de
algum procedimento ou documentos com elementos suficientes para a
propositura da ação penal. Os exemplos podem ser as conclusões de comissão
parlamentar de inquérito e os procedimentos administrativos, ou, se com a
representação forem oferecidos elementos que habilitem o Ministério Público
a promover a ação penal (CPP, art. 39 §5º). É nesse caso que o Dr. Scarance
Fernandes disse que “é muito comum a apuração indireta [itálico meu) de
crimes através de sindicância e processos administrativos’. É indireta,
porque não se trata de investigação criminal, mas de apuração de ilícito
administrativo durante a qual se comprovou infrações penais.
19. O certo é que as exceções apresentadas estão consignadas na
Constituição. Se existe lei que atribua a função de polícia judiciária a
outro órgão ou instituição, ela contraria o disposto no art. 144, §§ 1º e
4º), da Constituição, e é inconstitucional. Em todo caso, nenhuma das
exceções mencionadas, quer as consignadas na Constituição, quer as
referidas em Lei, beneficiam o Ministério Público. Note-se, enfim, que nem
mesmo a tese de que o inquérito é “facultativo” lhe abre a possibilidade do
exercício direto do poder de investigação na esfera penal, porque só o é
quando existe outro meio já constituído (procedimento, documento) que, por
já conter a definição da infração, de seu autor etc., o dispensa. Veja-se
bem, a sua dispensa nos casos previstos não defere ao Ministério Público o
poder de investigação direta.
20. Volto à questão da investigação seletiva n. 1 3 supra, para reafirmar a
competência exclusiva da polícia judiciária estadual e federal, cada qual
no âmbito de sua competência, para a investigação na esfera penal comum; as
exceções do inquérito policial militar e de comissões de inquérito não
infirmam aquela exclusividade em relação às infrações penais comuns. Não há
na Constituição nada que autorize o Ministério Público a instaurar e
presidir inquérito criminal. Ele o tem feito por via do inquérito civil
previsto no inc. III do art. 129, com notório desvio de finalidade, já que
o inquérito civil é peça de instrução preparatória da ação civil pública
consignada a ele no mesmo dispositivo e não evidentemente de instrução
criminal. Ou tem pretendido usar de procedimento administrativo próprio,
como o art. 26 do Ato 98/96 do Procurador-Geral de Justiça de São Paulo
definiu, com desvio ainda mais sério, porque, a toda evidência,
procedimento administrativo não é meio idôneo para proceder investigações
criminais diretas. O fato mesmo de se recorrer a tais expedientes
demonstra, à saciedade, que o Ministério Público não recebeu da
Constituição o poder para promover investigações diretas na área penal.
A propósito dessas questões, permito-me transcrever texto do meu parecer já
citado antes:
Mais contundentemente inconstitucional é o disposto no art. 26 do Ato
98/96, quando atribui ao órgão do Ministério Público a função
investigatória direta. Eis o texto:
“Art. 26. O órgão do Ministério Público poderá promover diretamente
investigações, por meio de procedimento administrativo próprio a ser
definido em Ato do procurador-geral de Justiça, ouvido o colégio de
Procuradores de Justiça.
“1 - se houver necessidade de providência cautelar;
“II - quando as peculiaridades do caso concreto exijam em prol da eficácia
da persecução penal”
“Em essência”, como lembrei naquele parecer referido, com esse dispositivo
institui o Ministério Público, sponte propria, particular forma de
inquérito, extrapolando, por certo, sua competência institucional
constitucionalmente estabelecida, Acrescentei, ipsis litteris: “O
procedimento administrativo, referido no dispositivo, é uma contrafação do
inquérito civil previsto no inc. III do art. 129, da Constituição, que não
pode ser transmudado em mal disfarçada forma de inquérito penal, porque tem
destinação própria qual seja servir de peça informativa prévia à
propositura da ação civil pública para os fins ali previstos. A apuração
das infrações penais é uma das atribuições exclusivas da policia civil, que
se encontra expressamente prevista no art. 144, §4 º, da Constituição
Federal. Não há como legitimamente passar essa atribuição para o Ministério
Público por meio de ato administrativo ou de qualquer medida legislativa
infraconstitucional, sem grave afronta a normas e princípios
constitucionais. Vale dizer, pois, que o tal procedimento administrativo
próprio’ é, na verdade, um expediente de invasão de competência, desprovido
de base legal”10.
21. O Ato Normativo n. 314-PGJ/CPJ, de 27 de junho de 2003, regulamentou o
procedimento administrativo referido no citado art. 26 do Ato Normativo
98/1996. Sua ementa procura amparar sua legitimidade declarando que
regulamenta, na área criminal, o procedimento administrativo previsto no
art. 26, 1, da Lei Federal n.8.625/1993, repetido no art. 104, I, da Lei
Complementar Estadual n. 734/1993. Esses dispositivos, por seu turno,
regulamentam o art. 129, VI, da Constituição Federal, que inclui entre as
funções institucionais do Ministério Público ‘expedir notificações nos
procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações
e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva”.
Nem esse dispositivo nem os daquela s leis autorizam “procedimento
administrativo criminal” de que fala o art. 2º do citado Ato 314/2003. O
art. 26, I, da Lei 8625/1993 estabelece o seguinte:
“Art. 26 - No exercício de suas funções , o Ministério Público poderá:
“1 - instaurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos
administrativos pertinentes e, para instruí-los
“a) expedir notificações para colher depoimentos ou esclarecimentos e, em
caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva,
inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas
previstas em lei;
“b,) requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridades
federais, estaduais e municipais, bem como dos órgãos e entidades da
administração direta, indireta ou fundacional. de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
“c) promover inspeções e diligências investigatórias junto às autoridades,
órgãos entidades a que se refere a alínea anterior”.
Como se vê, esse dispositivo, repetido ipsis litteris no art. 104, I, da
Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo (Lei Complementar
104/1993), não contém nada que autorize a instauração de procedimento de
investigação criminal. Ele autoriza o Ministério público, no exercício de
suas funções, a instaurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos
administrativos pertinentes, e todo o conteúdo de suas alíneas são
tipicamente administrativos, ou referem-se a procedimentos tais como a
sindicância administrativa, o inquérito administrativo e o processo
administrativo e se destinam a apurar infrações disciplinares e eventual
aplicação de sanções administrativas (Lei do Ministério Público da União,
arts. 246-261, Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo, art. 251),
pois, procedimento administrativo não é procedimento idôneo para
investigação na esfera penal, de sorte que, também nesse particular, o
referido dispositivo extrapola as balizas constitucionais das funções
institucionais do Ministério Público, até porque se são procedimentos no
exercício de suas funções, e se em suas funções não entra a investigação
criminal direta, o procedimento administrativo não poderia converter-se em
inquérito criminal, sob a presidência de um membro do Ministério Público
como pretende o Ato 314/2003, que assim contraria regras e princípios
constitucionais.
O art. 2º desse Ato estatui que o membro do Ministério Público, no
exercício de suas funções na área criminal, poderá, de oficio ou em face de
representação ou outra peça de informação, instaurar procedimento
administrativo criminal quando, para a formação de seu convencimento,
entender necessários maiores esclarecimentos sobre o caso ou o
aprofundamento da investigação criminal produzida. Ora, se o membro do
Ministério Público tem conhecimento de crime e não tem os elementos suficientes
para a propositura da ação penal competente, o que lhe compete, de acordo
com a Constituição (art. 129, VIII), é requisitar a instauração do
inquérito policial, não lhe cabendo promovê-lo, por si mesmo, de oficio, ou
em face de representação ou outra peça de informação. Por outro lado, se
necessita maiores esclarecimentos sobre o caso ou o aprofundamento da
investigação criminal produzida, não pode ele substituir a autoridade
competente para efetivar a investigação (a polícia judiciária). O que lhe cabe,
em tal circunstância, é também, nos termos do mesmo dispositivo
constitucional, ‘requisitar diligências investigatórias” à autoridade
competente, o presidente do inquérito policial.
Claro está que, se esse chamado ‘procedimento administrativo criminal” (o
nome é uma contradição em termos, pois, se é administrativo não é criminal,
se é criminal não é administrativo), se esse procedimento se limitasse ao
“aperfeiçoamento, celeridade, finalidade e indisponibilidade da ação penal”
(Ato 314/2003, art. 2º, §1º, II), ou à “prevenção e correção de
irregularidade, ilegalidade ou abuso de poder relacionado com a atividade
de investigação” (art. 2º, §1º, III) ou à “fiscalização da execução de pena
e medida de segurança” (art. 2º, §1º, V), nada haveria a objetar, porque
são atribuições que estão dentro das funções do Ministério Público. O que
se reputa transgressor da Constituição é a pretendida investigação criminal
direta, naquele Ato 314/2003 encarapuçada sob o manto do “aperfeiçoamento
da investigação, visando à preservação ou obtenção da prova, inclusive
técnica, bem como a validade da prova produzida, para fins de persecução
penal” (art. 2º, §1º, IV), mas que está definido na letra “b” do art. 26 do
Ato 98/96 que confere aos membros do Ministério Público (de São Paulo) o
poder de estabelecer procedimentos administrativos para promover
diretamente investigações criminais [ou seja, “promover diretamente
investigações, por meio de procedimento administrativo próprio ... b) -
quando as peculiaridades do caso concreto exijam em prol da eficácia da
persecução penal”]. E isso é o que tem ocorrido na prática: órgãos do
Ministério Público instauram um procedimento administrativo com o fim
precípuo, não de apurar ilícitos administrativos, mas de apurar ilícito
criminal, convocando supostos infratores, testemunhas etc., etc. Não se
trata daquele argumento, que, às vezes, se ouve de que lhe é lícito
concluir as investigações para apurar infrações penais e, sendo o caso,
intentar a ação penal competente, quando ele instaura um inquérito civil ou
um procedimento administrativo, e, no seu desenvolvimento, encontra indício
de tais infrações. Na verdade, na prática, serve-se o Ministério Público,
ou do inquérito civil ou de procedimento administrativo, diretamente, como
meio de proceder a investigações na esfera criminal. Como se disse antes,
isso constitui um desvio de finalidade, uma fraude à Constituição que não
lhe confere tal poder.
22. Há, de fato, quem sustente que, quando o Ministério Público instaura o
inquérito civil como instrução prévia da ação civil pública e, no seu curso
do procedimento, descobre infrações penais, estará ele autorizado a
prosseguir nas investigações criminais para apurar as infrações penais
possíveis. “Autorizado” por que norma constitucional? O inquérito civil é
“uma investigação administrativa prévia, presidida pelo Ministério Público,
que se destina basicamente a colher elementos de convicção para que o
próprio órgão ministerial possa identificar se ocorre circunstância que
enseje eventual propositura de ação civil pública”. Esse conceito é de um
ilustre jurista membro do Ministério Público, Hugo Nigro Mazzilli. Em
essência, é essa também a concepção do Min. Celso de Mello, emitida quando
assessor do Gabinete Civil da Presidência da República. Disse ele: “O
inquérito civil, em suma, configura um procedimento preparatório, destinado
a viabilizar o exercício responsável da ação civil pública”.’2 Se é assim,
e é, não há como distorcer esse importante instrumento, para transformá-lo
num inquérito policial.
A ação civil pública se destina a apurar responsabilidade por dano ao meio
ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico e a outros interesses difusos e
coletivos, e também à proteção do patrimônio público e social (Lei
7.347/1985, art., 10, e CF, art. 129, III). Tem como objeto a condenação em
dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer
(Lei.7.347/1985, art. 3”). Para tanto é que a lei e também a Constituição
prevê o inquérito civil que não pode ser convertido (ou distorcido), nem
direta nem indiretamente, em procedimento de apuração de infração penal.
Se, no curso do inquérito civil ou de procedimento administrativo, se
deparar com possível infração penal, seu presidente tem que remeter as
peças pertinentes à polícia judiciária, nos termos do art. 129, VIII, para
a instauração do competente inquérito policial, pois, repita-se, membro do
Ministério Público não tem legitimidade constitucional para presidir a
inquérito com o objetivo direto ou indireto de apuração de infração penal,
pois a apuração de infração penal, exceto as militares, é função da polícia
judiciária, sob a presidência de delegado de polícia (CF, art. 144, §4º).
VI. Resposta à consulta
23. Enfim, à vista do exposto, posso responder sinteticamente à consulta,
nos seguintes termos:
Não. Em face da Constituição Federal de 1988, o Ministério Público não pode
realizar nem presidir investigação criminal. É o meu parecer. José Afonso
da Silva
NOTAS DE FIM
1.Cf. Renaud vau Ruyrnbeke, Le juge d’instruction, 3ª. ed., Paris, Presses
Universitaires de France ,1996, p. 7.
2. Cf. Bismael B. Moraes, Direito e Policia, urna introdução à polícia
judiciária, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1986, p. 75.
3. Cf. a doutrina de Marshall e de outros constitucionalistas em Ruy
Barbosa e deste mesmo, Comentários à Constituição Federal Brasileira, Vol.
1, São Paulo, Saraiva, 1932, pp. 190 e ss.
4. Cf. Princípios fundamentais do processo penal, São Paulo, RT, 1973, p.
61. Outras partes do livro são bastante instrutiva a respeito da
investigação na esfera penal, do inquérito policial e de sua função.
5. Cf. José Afonso da Silva, parecei citado, o, 21.
6. Cf. José Afonso da Silva, Parecer: Controle externo da atividade
policial como uma das funções institucionais do Ministério Público –
Entendimento do art., 129, VII, da Constituição Federal – Conteúdo da lei
complementar e seus limites constitucionais – Competências exclusivas das
polícias, em Revista ADPESP, ano 17 – n. 22 – dezembro 1998, pp. 19 e ss.
7. Cf. Código de Processo Penal Militar, arts. 7º, 8º e 9º.
8. 0b. cit. ,p. 17.
9. Cf. O inquérito civil, p. 54, apud Luiz Guilherme da Costa Wagner
Júnior, A ação civil pública como instrumento de defesa da ordem
urbanística, Belo Horizonte, Del Rey, 2003, p. 151.
10. Cf. em Hely Lopes Meirelles, Mandado de segurança, ação popular, ação
civil pública, mandado de injunção,“Habeas-data”, São Paulo, RT, 1989, nota
2 à p. 122. Também em Luiz Guilherme da Costa Wagner Júnior ob. cit., p,
159 A. JOSÉ AFONSO DA SILVA MENSAGEM ENVIADA POR: FERNANDO BEATO. DELEGADO
DE POLÍCIA – DIRETOR REDATOR DA ADEPOL BRASIL – REPRESENTANTE DA
PRESIDÊNCIA DA ADPESP EM BRASÍLIA – E ASSESSOR PARLAMENTAR DO DEPUTADO
MARCELO ORTIZ – PV/SP
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Muito ouço falar sobre PEC 37 e diante de tantas dúvidas, formadora de opinião que sou, devido a minha profissão de Professora de Educação Básica( nível médio), resolvi pesquisar e ver notícias diversas sobre o assunto de tal forma a verificar as opiniões dos dois lados(defensores e opositores da aprovação da PEC 37) antes mesmo de pensar em discutir o assunto com os alunos em sala de aula. Pesquisando,acho coerente analisar os argumentos citados para a aprovação de tal.No entanto, fiquei com uma dúvida:
ResponderExcluirSendo aprovada a PEC37 qual será o papel que irá assumir o Ministério Público perante a sociedade brasileira?